A rua onde moro tem só duas quadras e só uma delas com casas de habitação; a outra comporta as laterais de um depósito de botijões de gás, um sacolão e um lanchão. Na verdade, deveria chamar-se de travessa e não rua; é perpendicular a duas ruas movimentadas e a uma das maiores avenidas da cidade.
É um lugar muito tranquilo e a quase totalidade dos vizinhos é proprietário das suas casas, vivendo nelas há muitos anos. Mesmo assim, ainda não há um total entrosamento entre todos. Ou porque alguns são os filhos de antigos vizinhos e não seguiram a convivência deles, adaptando-se mais aos tempos modernos de cada um por si, ou porque são mais recentes no espaço e limitam a sua confiança a um universo restrito.
Na verdade, esta é o tipo de rua em que o entrosamento poderia ser total e em que medidas de segurança poderiam ser adoptadas com a interveniência de todos. Mas ainda não é.
Ontem, como em todas as vésperas de ano novo, a movimentação foi grande e mais porque muitos amigos de alguns vizinhos aqui se concentraram para tomar umas latinhas de cerveja e soltar fogos de artifício, muito antes da meia noite; durante toda a tarde até.
Lá pelas dez horas da noite, a rua estava sossegada. Todos estavam comendo e bebendo nas suas casas, num ante pasto da ceia da virada. Saí até ao portão de casa e notei que o grande portão eletrónico da residência da frente estava totalmente aberto. Dos três ou quatro carros que lá costumam estar, estava só um. Nenhuma luz acesa e nenhum sinal de vida.
Fiquei pensando, repensando e concluí que a situação não era normal. Tentei contactar o vizinho do lado daquela casa, mas ele não estava. Fiz uma vistoria geral e nada mais encontrei de anormal. Fiquei por ali mais algum tempo e aproveitei para tentar descontrair o meu cão que muito sofre com estes bombardeamentos dos fogos de artifício.
Daí a pouco o vizinho que eu procurara chegou. Regressava da missa com a sua mulher e parou preocupadíssimo defronte daquele portão escancarado. Trocámos ideias a respeito e soube, então, que os donos da casa viajaram e deixaram com ele o controle remoto do portão com o pedido de dar uma olhada no local.
Barra pesada! Assumir uma responsabilidade dessas e pensar que num pequeno espaço de tempo de ausência algo de errado acontecera. Claro que ninguém se pode sentir culpado por algo que tenha acontecido mas, até provar que focinho de porco não é tomada de luz, é difícil.
Chegámos à conclusão que as ondas sonoras dos rojões e bombas tiveram o mesmo efeito do control remoto que aciona a abertura e fechamento do portão.
Pouco antes da meia noite, o vizinho encarregado de vigiar saíu porque tinha marcada presença em casa de familiares noutro lugar da cidade. Veio até mim e pediu-me que eu ficasse com o controle remoto e, a partir daí, assumisse o seu lugar…
Assim foi a minha passagem de ano. Um olho no gato e outro no prato. Acabei até por ir dormir mais tarde e duas vezes acordei na madrugada para dar uma vista de olhos nos arredores. Hoje, às 11 horas da manhã, houve a rendição da guarda…
1 comentário:
Deve ser muito bom ter você de vizinho...Tem casa pra vender do lado?Cubro qualquer oferta...hehehe
Mas agora falando sério...
És mesmo incrível, Alentejano.
Eu tenho muitos bons motivos para te admirar, mas este teu espirito de cooperação,ligadíssimo sempre, preocupado com as pessoas, as coisas, este teu ôlho observador...são detalhes de tua personalidade que me agradam muito.
Porque estas qualidades são raras, hoje em dia...
Tenho muito orgulho de ser tua amiga.Falei sério!!!
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