José trabalhava num setor de logística de uma grande indústria. Funcionário abnegado e muito competente, era estimado por todos os companheiros e tinha o reconhecimento dos méritos pelo seu chefe. Por tudo isso, assumia funções de chefia na ausência deste. Não se configurava aqui algum tipo de puxa-saquismo, pois o chefe detestava puxa sacos e não muito raramente logo cortava as asinhas de algum que se atrevia a desse modo se evidenciar. O chefe muitas vezes contava casos em que passou apertos com esse tipo de comportamento de engraxadores sabujos, na escola, na vida profissional e, principalmente, durante o serviço militar. Por isso, todos sabiam que esse tipo de comportamento não seria aceite jamais.
É natural que o relacionamento pessoal se tenha aprofundado durante os quatro anos de convivência daquela turma, chegando até ao ponto de confidências de fórum íntimo entre uns e outros. Era como uma família.
José, a certa altura, começou a extrapolar nessa abertura e não se fazia rogado em contar na frente dos companheiros cenas muito íntimas do seu relacionamento conjugal. Ficavam todos atônitos perante a descrição de certas passagens no relacionamento sexual entre ele e a esposa.
Um certo dia, José contou com riqueza de pormenores como tinha sido a noite anterior entre o casal na cama. Não só substimou a performance da esposa, algo que frequentemente fazia, como ainda chegou ao absurdo de ter confessado que se levantou cedo para ir trabalhar e deixou sobre a banquinha de cabeceira uma nota de 500 paus. Isso foi o cúmulo! Sem palavras, chamou a esposa de puta. Mas porquê?...
Naturalmente, o seu chefe fez questão de conhecer pessoalmente a esposa do seu subordinado, os filhos do casal, os sogros e cunhados que viviam no aglomerado de três habitações.
Num fim de semana lá foi o chefe. A surpresa foi enorme! Estava ali uma mulher linda e formosa, porém muito tímida mas de trato agradável. Joaquim (o nome do chefe de José) ficou confuso e não entendia o comportamento do seu subordinado em relação à sua esposa (Martinha de seu nome).
A convite de José, o seu chefe Joaquim começou a frequentar aquela casa com uma certa assiduidade. Frequentemente se fazia um churrasco ou mesmo uma sardinhada, pois este era português e gostava de partilhar pratos típicos da cozinha da sua terra. E em algumas dessas ocasiões o vinho ou a cerveja operavam milagres...
Martinha, mesmo tímida, não destoava daquela manha feminina e muitas vezes deixava o Joaquim embaraçado. Sabendo que Joaquim estaria presente em mais um fim de semana, fazia questão de se vestir a preceito e mostrar as curvas em realce do seu belo corpo. Olhares fulminantes lançados de uns maravilhosos olhos negros para o visitante, seguidos de um baixar de cabeça como se envergonhada ficasse. Às vezes olhava de soslaio para o marido, talvez buscando um gesto de reprovação se por acaso ele tivesse percebido algo ou mesmo verificando se nada este teria notado. Como se costuma dizer na linguagem popular, a chapa começou a ficar quente...
Naquele verão escaldante, Martinha se inscreveu numa caravana (excursão) para o litoral paulista, algo que fazia costumeiramente. Sempre ía com algumas amigas e nunca o marido a acompanhava. Ele era fissurado em televisão e jamais deixaria de assistir ao seu programa favorito dos domingos --- o Fantástico... Abertamente Martinha convidou Joaquim a participar. Este, sem graça, olhou para o José que aquiesceu dizendo não ver nenhum mal nisso. E assim foi. Joaquim também foi inscrito na caravana, mesmo detestando tal tipo de programa farofeiro. Além disso, ele era casado e, de alguma forma, teria que inventar algo para dizer lá em casa. Mas o português de santo não tinha nada, apesar de tal parecer... Além do mais, não iria deixar escapar por entre os dedos uma oportunidade de ouro para comer a mulher do José se para tal houvesse engenho e arte...
Naquela noite de sábado (viajariam durante a noite para cedo chegarem à praia), o ônibus foi recolhendo os participantes da excursão num porta-a-porta. E lá chegou na porta da residência de José onde recolheu Martinha e Joaquim, além de outros vizinhos. Os dois compartilharam as duas poltronas lado a lado. Mas, talvez por causa dos vizinhos, José entrou no ônibus e chamou Martinha para uma conversa ao pé do ouvido. A partir desse momento ela passou a ocupar uma outra poltrona, mas a meio da viagem juntou-se a Joaquim...
Chegaram na Praia Grande, ainda hoje a mais farofeira das praias do Brasil. E ninguém sabe o que aconteceu naquele domingo na areia ou no mar...
Nessa altura, mercê de grande crise económica, Joaquim e José já tinham sido demitidos do emprego naquela indústria onde ambos trabalharam e cada um tinha outra ocupação. Não obstante, os encontros na casa de José continuaram. E nesse subsequente fim de semana Joaquim por lá apareceu mais uma vez. Mas houve uma surpresa, pois algo aconteceu que não estava previsto. José convidou Joaquim para irem até um bar nas imediações para terem um papo sério. Joaquim ficou preocupado e com a pulga atrás da orelha. Há maridos chifrudos que se vingam nas mulheres; outros há que aprontam com os amantes delas. Mas um corno manso não agiria assim, no pensar de Joaquim. Ou talvez sim!?...
Apesar de tudo, o português era valentão e dificilmente se deixaria intimidar. Topou a parada! Naquele bar acabou por por não haver o papo sério e, entre uma cerveja e outra, optaram em disputar uma partida de snooker. É possível que José tenha mudado de ideia à última hora.
Anos se passaram e cada um para o seu lado vivendo as próprias vidas. Soube-se que José e Martinha se separaram e esta encontrou outro parceiro num novo casamento.
Por estes dias, José passou numa feira livre e qual não foi o seu espanto ao encontrar o seu antigo chefe que ali tinha o seu negócio. Ele parece não querer acreditar que Joaquim se transformara em feirante. Pela reação, parece ter interpretado que o ex chefe teria sido rebaixado na escala social (engano dele) pois desatou-se numa risada incontrolável e assim se foi. Do mesmo modo que surgiu, sumiu.
Teria o corno pensado que a vingança tarda mas não falha? Que inocente!
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