A minha crónica anterior, subordinada ao título “Extremos” tinha que ser escrita. Hoje tenho vontade de a apagar, excluir, deletar. Mas pensei melhor e concluí que ela faz parte de um todo se bem que também do passado.
Não escrevi nada directamente para a minha família e para alguns dos meus amigos como, por exemplo, um e-mail. Também com ninguém me comuniquei através do Skype ou do MSN, ou mesmo com alguma mensagem no Orkut, Facebook ou Twitter.
A situação para mim estava muito má. A minha cabeça não estava assimilando o que se passava e, além da doença diagnosticada, chegava a pensar, conscientemente, que poderia ficar louco. Apesar de ser um cara forte e de situações extremas ter enfrentado com coragem e abnegação, como um alentejano enfrenta, cheguei a pensar numa das últimas decisões drásticas. Talvez não tenha chegado a esse ponto por pensar nos meus netos, principalmente, e porque amo a vida.
Agradeço de coração --- que não sei se é um coração grande ou um grande coração ---, aos Amigos que me escreveram e-mails dando o maior apoio e acentuando o que há muito tempo eu já sabia, a existência de uma profunda amizade e transbordante carinho.
Hoje não só alertarei os mesmos de ontem, como todos os que constam das minhas listas de contatos. Todos saberão o que aconteceu e, porque um monte de tags colocarei, muita gente por esse mundo afóra tomará conhecimento do que se passou comigo e, certa e infelizmente, se estará passando sabe-se lá com quantos infelizes mais, muitos destes sem o discernimento ou possibilidades de tomar outro rumo. Mas torcerei muito para que as minhas palavras e a minha revolta, aventadas aos quatro cantos do Mundo, encontrem alguns a elas receptivos.
A minha revolta e a minha denúncia não serão encaminhadas à Imprensa. Não pretendo citar nomes. Serei ético, mas consciente de que algo do que aqui escrevo possa vazar por rumos que não tracei. Aí não será um problema em cima do qual alguém me queira encher o saco.
A noite em que eu consegui dormir um pouco mais, nos últimos quinze dias, foi esta última de domingo para segunda-feira. Tomei aquela bateria de comprimidos normalmente, como até então. Procurei um canto no sofá e tentando vencer os pensamentos negativos, dormi das 0 às 2. Tentei na cama, perto da janela para receber ar fresco da madrugada no rôsto e, assim, dormi das 3 às 5. Como não trabalhava na segunda-feira, procurei a cabeceira da cama e dormi das 5:30 às 7. Mais tarde, no sofá outra vez, dormi das 7 às 8. Depois não consegui dormir mais e sentei-me na área abservando os pássaros nas minhas árvores. Eles estavam felizes, como sempre, e parece que me transmitiam algo que eu não decifrava.
Fiquei relutante em tomar a habitual bateria de comprimidos, pois começava a sentir-me bem sem eles. Mas, como o médico me alertara que se eu parasse certamente não viveria muito mais, às 9 horas tomei-os todos. Meia hora depois começou o meu habitual sofrimento de todos os dias. Enfraquecimento das pernas e braços com formigação. Quentura no peito, ânsias de vómito, tontura e um sentimento de vazio no cérebro.
Desta vez decidi que iria ter uma segunda opinião de um cardiologista. Tinha que ser no dia e pagaria o quanto custasse. Entre alguns nomes fiquei voando sem saber a qual me dirigir e nem todos estavam disponíveis. Uma das minhas cunhadas sugeriu-me o dela que, além de ser professor numa renomada Universidade, era seu médico há muitos anos. Isso concorreu para a escolha e lá estava eu às 16 horas.
Uma clínica que transmite boa impressão a quem chega, não só pela organização, como também pela contestação de uma enorme equipe de cardiologistas.
Levei junto comigo as três recentes radiografias do tórax e uma específica do coração, bem como os últimos exames clínicos, mapa da pressão e relatório pessoal do meu estado de saúde, consultas e terapias. O médico apreciou essa minha organização e tudo foi útil.
Foi uma entrevista morosa e ali não ficou esquecido um único detalhe; até alguma coisa que eu jamais imaginaria me ser perguntada o foi. Percebi que tudo concorreria para um perfeito diagnóstico quando associado aos exames ali feitos na hora e os que ficaram programados para estes dias.
Finalmente o médico mandou-me deitar numa maca para fazer um último exame e, antes que eu subisse, disse-me: “o seu coração não está grande; ele é um coração normal!” --- E onde é que eu ouvi dizer que homem que é homem não chora? E foi o que aconteceu. Embargou-se-me a voz e as lágrimas corriam que nem cataratas pelo meu rôsto. Voltaram a correr agora que escrevo estas palavras, mas isso não me inibe e me dá forças.
Eu não tenho excesso de líquidos no corpo. Eu tenho gordura localizada porque sempre fui bom de garfo e colher, gosto de dormir a sesta e pouco ando a pé por aí… A falta de ar que originalmente me levou ao médico do hospital e posteriormente ao primeiro cardiologista, deve-se à pressão do abdómen sobre os pulmões.
Três exames mais terei que fazer e já estão programados. Todos serão particulares e, portanto pagos. Farei um plano de saúde depois; é necessário, pois não se sabe o dia de amanhã…
Anteriormente escrevi uma outra crónica em que abordava essa discrepância de laudos médicos e dei-lhe o título muito sugestivo de “Filhos da Puta”. Na época não achara outro mais ajustável e até hoje acho que está bom.
O título para a crónica de hoje ainda não emergiu. Mas vejamos e pensemos sobre isto. O primeiro médico (clínico geral) que me avaliou na primeira vez que fui no hospital, pelo Sistema Único de Saúde, achou que todos os exames clínicos estavam bons. Perante o raio X do tórax exclamou que os pulmões e o coração estavam bonitos. Sim, foi essa a expressão usada. Levei todo o material ao meu médico do Posto de Saúde com o qual tenho consulta a cada 4 meses. Também clínico geral, teve a mesma opinião sobre todos os exames.
Numa segunda ida ao hospital, nas emergências, por causa dessa fatídica falta de ar nocturna durante o sono, voltei a fazer a mesma bateria de exames e só com a diferença de, além de chapa do tórax, também uma específica do coração. Tudo normal outra vez! Só que fui aconselhado a procurar um cardiologista, pois ali não me encaminhavam e isso seria com o meu médico do Posto.
Como a consulta no Posto só poderia ser marcada para Setembro, fiquei com a cabeça às voltas. Tendo alguém me indicado uma clínica popular com preços módicos e bons profissionais, marquei uma consulta com o cardiologista e dois dias depois lá estava eu. Mostrei todos os exames (sempre os carrego comigo) e, quando ele olhou as chapas, exclamou: “o coração está enorme e já sei o que você tem!”. O resto eu já comentei anteriormente.
Neste última sábado que entrei nas Urgências do hospital, situação que também já relatei anteriormente, lembro que o médico, neuro-cirurgião, apontou-me na chapa de raio X o pedaço enorme da dilatação do coração. Eu nem imaginava que o coração estivesse tão cá em baixo… Depois foi o que também já relatei.
Agora eu pergunto: um médico cardiologista e um outro neuro-cirurgião nunca terão visto um coração quando estudaram? Nunca aprenderam a interpretar as imagens radiológicas? Será que o cardiologista obtém algumas vantagens quando receita, a êsmo, medicamentos caríssimos? --- O que está acontecendo com os nossos médicos e com o nosso sistema de saúde?
Joguei no lixo todos os comprimidos que tomei durante quase um mês. Foi essa a ordem do Professor Doutor. Certamente levará algum tempo para limpar todo o mal que me ocasionaram, mas senti que hoje passei um dia maravilhoso sem eles. Estou até relutante em tomar o segundo faixa preta do total de 20 que ontem me foram receitados para organizar o meu conturbado sono; na última noite dormi maravilhosamente. Não o tomarei, a não ser que sinta falta dele.
Hoje tomei a água que me tinha sido proibida; tomei uma garrafa de vinho alentejano junto com um sashimi que fiz na feira. Fiz de madeira uma rampa de skate para o meu neto. Amanhã passearei com o meu cachorro, pois não mais estou proibido de o fazer. Do mesmo modo passearei em volta da quadra com a minha mulher e colocaremos em dia o papo que há muito estava em stand by. Ela foi uma grande companheira nestes últimos dias de grande sofrimento.
Viva o Amor e a Vida!