Estive em Timor muito pouco tempo, comparando com aquilo que eu
desejava.
Nao vivi em Dili, centro confuso e comercial onde a cada esquina se
encontra una criança vendendo peixe, banana, manga, cigarros ou dvds
do filme mais recente que alguém gravou numa sala de cinema indonésia.
Vivi no meio de Gleno, pequena capital de distrito, tão grande como uma
rua principal e uma dúzia de ruas perpendiculares.
Onde às quintas-feiras, o mercado se enchia de gente vindo Deus sabe de
onde para fazer as suas compras, alguns legumes, alguma fruta, alguma
carne que as gentes compravam sem se importar da carne estar ali,
exposta ao sol, à chuva, ao pó dos carros, às mãos dos passantes...
Gleno, pequena capital, mais pequena do que uma vila simples de
Portugal, mas tão cheia de cor, tão rica em cheiro e sabores, onde o sol
iluminava todos desde às 5h da manhã. E a noite caía pouco depois das
16/17h à tarde.
Onde as criançais surgiam por todos os lados, sempre com Aquele sorriso
que nunca consegui entender....
Onde homens e mulheres passavam, carregando crianças, roupas, sacos,
cestos, de tudo um pouco....
Onde homens e mulheres faziam fila para ir ai posto médico -- uma
clínica, chamavam-na -- sem saber quando saíriam... para alguns deles, sem
saber se sairíam.
Onde homens e mulheres, de todas as idades, mas sobretudo jovens,
vivem ao sabor das plantações de café, bem numerosas.
Onde a política de Dili parece ser ali tão longe e ali tao perto
porque, afinal, foi por ali por aqueles montes que a Resistência se
escondeu durante tantos anos.
E Gleno, com aquela sua gente tão linda e tão cheia de histórias e
estórias para contar.... e quando se toca mais além do que a superficie
desta gente, percebe-se que atrás do sorriso que continua fixo no rosto,
há muita dor, muitas lágrimas caídas, muitas dores sofridas mas, apesar
de tudo o que sofreram e sofrem ainda, apesar de tudo por aquilo que
passaram e passam ainda, a esperança de um futuro melhor permanace.
Uma grande confiança que Deus, là em cima, não os esqueceu e que um
dia, todos eles poderão conhecer uma vida feliz, sem medo, sem opressão,
sem pobreza.
E Gleno, com aquela sua gente tão bela, sempre curiosa em aprender o
que se passa do outro lado daquelas montanhas que os separa de Dili e do
resto do mundo.... e um sorriso natural ao imaginar que algures no
mundo, há bocadinhos de algodão que cai do céu.... e aquele orfanato, onde
dezenas de crianças vivem e crescem, como podem e como conseguem, sem
grande ajuda de fora, depois de ter perdido seus pais...
E Gleno, com aquela sua gente tao simples e tao integra, com aquela
brisa sempre presente e com aquelas chuvas tão bruscas e repentinas como
breves...
Quando se sai de Dili em direcção a Gleno, não se imagina o que vamos
descobrir...
Gleno parece um mundo à parte. O caminho sinuoso que sobe,
sobe, sobe, faz-nos descobrir o mar là em baixo, tão limpido, tão
claro, tão azul... Mais além, aquelas primeiras ilhas da indonésia... e no
infinito, o mar que se confunde com o céu.
A pouco e pouco, deixa-se
o mar para trás e entra-se na terra do café. Plantações pela
direita, plantações pela esquerda; umas cabanas aqui, umas casitas ali e,
por todo o caminho, crianças, mulheres e homens que vão e que vêm ("Hello
Mister"), sempre com o eterno sorriso. Quando se entra na mata,
descobrem-se novos cheiros, novas cores. Há mangas e bananas um pouco por
todo o lado, vendidos nessas cestas feitas de folhas de bananeira,
e sempre aquele sorriso.
Descobri em Timor uma paisagem magnífica, como raramente tive
opotunidade de ver em toda a minha vida. Paisagens belas ainda selvagens,
que uma dia certamente serão em parte, senão todas, destruidas pelo poder
enorme do turismo. Mas o que realmente descobri de mais belo, foi a
sua gente.
Desde então (2002), é provável que muita coisa tenha mudado. As notícias
que aqui chegam são raramente felizes, as mensagens que recebo são de
medo, de dúvida, mas na minha memória e no meu coração o que fica é o
sorriso desta gente e a esperança que um dia (breve!) consigam,
finalmente, alcançar a paz.
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