sexta-feira, março 21, 2008

CARTÃO POSTAL

Quando há trinta e dois anos esta cidade de Campinas estendeu os braços para me receber como um filho seu, existiam dois lugares que eram os principais cartões postais --- o Parque Portugal, com a sua caravela e o cuidado jardim onde hoje é o Terminal Central. Por incrível que pareça, não possuo fotos de qualquer desses lugares ou as tenho em algum local que não me vem à lembrança; tive que recorrer à internet para ilustrar esta crónica... Todavia, enviei muitos dos postais referidos para os meus amigos nesse mundão afóra.
O jardim que ficava abaixo do viaduto, bem no centro da cidade, desapareceu para dar lugar a um terminal de ônibus urbanos e, consequentemente a um aglomerado de barracos da economia informal que nos dá a visão de uma favela; um lugar feio, desordenado e perigoso. A caravela do Parque Portugal afundou dois metros esta semana e isso exaltou os ânimos com grandes correrrias para achar as causas e os culpados.
Atenho-me ao problema da caravela. Ela é uma réplica exacta da Assumpção que fazia parte da expedição de Pedro Álvares Cabral quando da chegada ao Brasil em 1500. Há una anos atrás já apresentara problemas e adernou. Foi retirada das águas da lagôa, recuperada e fundeada nòvamente. Desta vez o problema parece ser muito mais grave. De imediato se começou a pensar em substituí-la por uma nova e verbas na ordem dos milhões se aventaram... Aqui é o país dos "milhões" roubados daqui, desviados dali e desaparecidos para o além...
Não sou engenheiro naval e jamais trabalhei num estaleiro, mas tenho conhecimentos, adquiridos na curiosidade e na experiência, que me deram a liberdade e autoridade para pensar que essa recuperação não seria um bicho de sete cabeças, principalmente com novos produtos e tecnologia que existem hoje associados, claro, aos ofícios tradicionais. Retirar-se-ía a caravela da água e colocar-se-ía em terra apoiada em cavaletes a exemplo do que se faz em qualquer estaleiro. Então, diagnosticar-se-ía a complexidade da problemática e aplicar-se-ía o receituário inerente.
Alguém haverá, certamente, que ao ler o simplista parágrafo anterior dirá, com sorriso irónico, que as coisas não são assim. Mas na verdade são! Entretanto, veio um engenheiro naval ontem, convidado para o efeito, dizer por outras palavras exactamente o mesmo que eu pensara. Acrescentou sòmente que, nos dias actuais as dificuldades são enormes para a realização dessa tarefa devido à falta de profissionais adequados, principalmente carpinteiros e às grandes dificuldades de adquirir madeira nobre.
Chegou-se ao ponto onde eu queria. Além de carpinteiros eu acrescento "tanoeiros" e sei que a maioria não conhece o termo... E será que não existe mais essa profissão? Ainda existe mas já se contam pelos dedos os profissionais, não pelo facto do aço inoxidável substituir totalmente a madeira na confecção de pipas e talhas para o vinho e as chapas de aço carbono eliminarem totalmente a mesma madeira na construção de pequenos barcos de pesca. Estamos caminhando para esse horizonte.
Muitos cursos técnicos acabaram. Ninguém mais quer aprender um ofício. E o grande buraco negro está exactamente nesse azimute. Por isso, alguns desses profissionais especializados são muito bem pagos e disputados, mesmo que não tenham qualquer "canudo" que só serviria para enfeitar uma das paredes da sala de visitas... No que tange à madeira nobre, ficamos com os cabelos em pé perante as milhares de queimadas e desmatamento ilegal.

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